La política electoral, si bien no debe desestimarse, no puede ubicarse en el centro de ninguna acción política radical seria, orientada a cambiar las instituciones que sustentan el sistema político, desmantelar las ideologías hegemónicas y fomentar el tipo de conciencia de masas en que habría de basarse un cambio social y político desesperadamente necesario.
Tarso Genro
Bobbio, Hegel, Marx e a crise do dereito democrático
I
“Lembrem-se da história daquele douto que havia estudado durante toda a vida e sabia todas as respostas possíveis, mas estava desesperado porque ninguém lhe fazia perguntas. Não tenho nenhuma resposta a dar, mas faço votos de que, após ter me escutado, alguém se ponha perguntas” [1]. Esta manifestação de Bobbio é inspiradora do presente texto, pois primando pela clareza conceitual, sua crítica aos enunciados do marxismo sobre o Direito e o Estado abriram indagações sobre a questão democrática, que ainda pendem de respostas completas. Perguntas, não só sobre o que Marx e os marxistas pensaram a respeito do projeto democrático moderno, mas também sobre os problemas específicos do Direito, no debate com outras correntes do pensamento filosófico.
Norberto Bobbio (1909-2004) foi um dos principais intelectuais europeus do século passado. Professor de Direito na Universidade de Turim, desenvolveu sua obra na Filosofia do Direito, na qual, como declarado discípulo de Kelsen, sistematizou e enriqueceu a Teoria Geral do Direito, nas diversas variantes do Positivismo Jurídico. Na década de 80 “migrou” suas reflexões para a Filosofia Política, terreno onde deu importante contribuição à doutrina política democrática e à teoria do seu ordenamento jurídico.
Bobbio teve curta militância política no imediato pós-guerra, no efêmero Partido da Ação e no seu periódico “Justiça e Liberdade”. A ideia central do partido era a tentativa de combinar os valores do socialismo com os valores da liberdade. Mais especificamente, a busca para promover a unidade dos valores do liberalismo político do século XIX, com as promessas de igualdade do Iluminismo democrático.
Celebrando os trinta anos da primeira edição de “O Futuro da Democracia”, proponho compartilhar esta reflexão sobre a obra de Bobbio, a partir do seu livro “O Futuro da Democracia”, publicado pela primeira vez em 1984, em Roma. As discussões nele propostas —alicerçadas em todo o processo reflexivo de Bobbio— fazem contraponto às teorizações marxistas mais conhecidas sobre as questões do Direito e do Estado. É um debate travado, tanto na academia como nos meios intelectuais mais amplos e reflete, também, as conquistas da inteligência democrática contemporânea e os dramas da democracia política no século XX. Ele se projeta para o futuro da experiência democrática, sejam quais forem os seus rumos, nos quadros de uma sociedade capitalista menos injusta ou na transição para uma sociedade pós-capitalista ainda indeterminada.
O percurso do debate demonstra que o republicanismo democrático de Bobbio e a experiência do comunismo italiano permanecem em dívida com a Democracia, mormente sobre a questão da “igualdade”. Se, de um lado, as promessas de liberdade ainda estão presentes na agenda ocidental (embora cada vez mais questionadas pelas imposições da nova ordem global), as promessas de igualdade permanecem estáticas, quando não francamente regressivas.
O iluminismo deixou um déficit de produção doutrinária no tema da igualdade, que foi “congelado” na teoria política das sociedades ocidentais. Bobbio, ao longo da sua obra, defendeu uma organização estatal associada e regrada, que garantisse as liberdades, com formas institucionais fundadas numa constituição legítima. Mais além das teorizações de todas as ordens, todavia, a história real vem mostrando que o capitalismo assimila as liberdades políticas, à medida que elas não viabilizem a negação do seu regime de produção. E o socialismo realmente existente, não as assimilou porque as liberdades —tanto civis como políticas— seriam instrumentos de restauração do capitalismo.
Estes dilemas reais não foram explorados, suficientemente, nas reflexões de Bobbio e não ensejaram, em consequência, análises mais complexas sobre critérios de valor, como diria Kant, para comparações entre os sistemas políticos efetivos do capitalismo democrático e os sistemas vigentes no “socialismo real”. Talvez, se assim o fizesse, Bobbio veria um pouco abalada a sua frieza lógico-dedutiva (não utópica), tão cara ao positivismo analítico, que foi o núcleo racional do seu método de reflexão. Interpor juízos de valor, para analisar um sistema, é deixar de lado —para os positivistas— uma “depuração necessária para ter uma análise científica do objeto em exame”, ou seja, “pressupõe justamente a (forma de) apuração mais abominada pelos positivistas” [2].
Bobbio compôs sua obra combatendo, à direita, com os inimigos sectários dos postulados humanistas do pensamento marxista; e, à esquerda, com os postulados socialmente limitadores do liberalismo político. Neste combate Bobbio reconheceu a “imperfeição” do projeto democrático, tanto no plano das instituições, como no plano social, mas não alterou a sua convicção quanto a superioridade deste Estado (organizador de procedimentos), como forma mais apropriada (da previsibilidade necessária à liberdade), para garantir as “regras do jogo estáveis” da democracia.
As formulações normativas da teoria de Bobbio continham, de outra parte, uma tolerância, marcada por uma certa visão fatalista dos limites do seu próprio normativismo, que lhe fazia aceitar o convívio, no projeto democrático moderno, do Governo legítimo com um certo grau de ilegitimidade, através do “Governo (ou Estado) invisível”. Bobbio, todavia, não se reportava a esta duplicidade como uma totalidade, mas como reconhecendo uma espécie de conúbio, atinente ao Estado de Direito, invariavelmente existente, que implicava reconhecer no Estado um lado “sadio” e legítimo e uma “anomalia” permanente.
II
Bobbio demarcou com a visão do marxismo soviético, cuja teoria do Estado e do Direito partia do pressuposto que o Estado, em geral (o Estado de Direito não seria exceção), seria um complexo de estruturas de poder para assegurar a dominação, especificamente como “dominação de classe”. No socialismo, esta dominação suprimiria as liberdades políticas para favorecer a promoção da igualdade.
Esta última característica do Estado de Direito Socialista “real” fez de Bobbio um duro crítico da teoria marxista do Estado e do Direito, sem contudo levá-lo a abandonar o diálogo com os marxistas. No livro “O Futuro da Democracia”, Bobbio revisitou os desafios que enfrentou ao longo da sua vida, como crítico das concepções marxistas sobre Estado e Democracia, mas predominantemente dialogou e criticou com as versões do marxismo dos teóricos soviéticos. E o fez, tanto em relação as suas linhas mais “duras”, originárias das elaborações da Academia de Ciências da URSS (fundadas nos seus textos “canônicos”), como em relação as suas versões mais brandas, reformistas típicas, de intérpretes de Gramsci, do último Togliatti e de Berlinguer.
Bobbio não considerou que as concepções do marxismo soviético e as concepções do positivismo-lógico sobre o Estado e o Direito poderiam ter um traço comum, de cunho positivista-naturalista. Nem levou em consideração, portanto, que a concepção marxista soviética estava ancorada na inevitabilidade (uma naturalização “economicista”) da transição do capitalismo para o socialismo e deste para o comunismo. (A legitimidade do Estado de Direito Socialista, estaria, assim, justificada por esta função histórico-universal, induzida pela evolução das forças produtivas). Bobbio não atentou, de outra parte, que na concepção positivista-lógica sobre a Democracia e o Estado de Direito, também estava contida uma inevitabilidade do império das formas de procedimento–arbitramento como únicas (naturalização “institucionalista”) capazes de proteger o direito “natural” à liberdade. (Tornar esta forma “direito posto” seria, então, o único meio para a garantia das liberdades).
Ambas as concepções —como se vê— traduzem uma certa “inevitabilidade” característica dos processos da natureza, não dos processos sociais, pelos quais os seres humanos produzem alternativas. A saber: a marcha “natural” do capitalismo em direção ao socialismo, empurrada pela evolução das forças produtivas, “desembocaria” no socialismo; a marcha inevitável da associação democrática para a organização estatal-formal de caráter superior, desembocaria na garantia das liberdades. Na primeira hipótese, caberia à ordem jurídica do Estado de Direito Socialista empurrar a sociedade para o comunismo, sem excluir a liberdade (tida como “libertação de classe”); na segunda, caberia à ordem jurídica do Estado de Direito Democrático, formalizar o predomínio da liberdade política e do direito de propriedade, acima da igualdade (sem excluir a igualdade do discurso democrático).
A grandeza das elaborações de Bobbio esteve na sua capacidade de demonstrar que um projeto socialista, sem previsibilidade normativa (sem procedimentos previsíveis e públicos), sem cena pública democrática (sem partidos e divergências na cena pública) tende sempre para o totalitarismo. A sua limitação está em que ele comparou principalmente o arquétipo do Estado de Direito ocidental (que estaria presumido no seu “dever ser”), com o Estado Socialista “real” (naquilo que foi o seu “ser”). Ou seja, quanto ao Estado de Direito das revoluções do século XIX, a abordagem de Bobbio privilegiou como ele deveria e poderia funcionar, no plano jurídico e político ideal; e, quanto ao Estado Socialista das revoluções do século XX, ele privilegiou como efetivamente ele funcionou, no plano histórico real.
Com isso Bobbio instituiu um processo lógico-dedutivo, pelo qual mais frequentemente comparou as formas democráticas ocidentais com a realidade dos sistemas inspirados pela URSS. Não se conhece uma análise comparativa de Bobbio, por exemplo, dos ritos invisíveis dos Processos de Moscou, contrastados com os mesmos ritos do “Governo invisível”, promovidos pelos serviços secretos italianos com a OTAN, durante os “anos de chumbo” na Itália. Uma mensuração só quantitativa (e “interna”) destes processos, não considera os seus desdobramentos “externos”, através dos quais brilharia a agressão americana ao Vietnam, como “exceção” de Estado de Direito em países democracia madura, que não é excepcional, mas característica proporcionada por uma invisibilidade permanente e antidemocrática no seu funcionamento concreto.
Quanto ao número de pessoas, afetadas por tais mecanismos de poder, é certo que na Itália, em comparação com a URSS, o grupo atingido foi bem menor. As perdas de vidas humanas e a subtração do direito de defesa, nos processos de Moscou, foram muito mais graves. O que importa, contudo, nesta comparação entre os sistemas, como estruturas derivadas do Estado Moderno, é apontar as potencialidades totalitárias contidas nas suas instituições não- formais de poder, presentes ao lado das suas respectivas legalidades formais.
Bobbio, mesmo considerando o “Governo invisível” como um Governo presente no Estado de Direito, não se convenceu que a violação das “regras do jogo” é uma importante “regra do jogo”. E que o “Governo invisível” é uma condição, não uma anomalia do Estado de Direito, que exerce a sua violência de forma menos concentrada, mas que configura possibilidades reais nos dois Estados —soviético e liberal-democrático— que não podem ser consideradas só como “desvios” nos seus sistemas de poder.
As violências “exportadas” pelos Estados de Direito, nas suas tarefas imperiais-coloniais, também devem integrar os juízos de valor, para relativizar a sua superioridade humanística. A expressão do despotismo do Estado Moderno, tanto na transição para o fascismo, como ocorreu na Itália de Mussolini, como na transição para o stalinismo, como ocorreu no Estado Socialista com a “revolução proletária” —juridicamente consolidada com a Constituição Soviética de 36— são possibilidades de ambos os Estados.
Referi no meu livro “Utopia Possível” o seguinte: “O Marx em que me apoio para criticar ‘o marxismo real’ diz o seguinte: ‘A missão do operário que se libertou da estreita mentalidade do humilde súdito não é, de modo algum, tornar livre o Estado. (…) A liberdade consiste em converter o Estado de órgão que está por cima da sociedade num órgão completamente subordinado a ela(…)” [3]. Marx, como é sabido, não deixou nenhuma teoria acabada sobre a democracia socialista, nem uma Teoria Geral do Estado Socialista e, muito menos, uma Teoria Geral do Direito. Mas o seu legado, ao longo do século passado, proporcionou mais além do marxismo soviético, obras complexas e importantes como as de Pashukanis, Cerroni e Karl Renner, até as mais simplistas e menores, como nas fórmulas positivistas de Stucka e Vishinski.
Lembremos, por outro lado, também o idealismo subjetivo de Ernst Bloch, cujo barroquismo intelectual não tornou irrelevantes as suas críticas ao marxismo economicista dos filósofos estatais. A introdução de Remo Bodei no “Karl Marx”, de Bloch, diz que o “princípio esperança” de Bloch, que dá força subjetiva a sua visão de “utopia realista” (concreta ou possível), polemiza com o niilismo existencialista de Heidegger (o “ser para a morte”), com a destinação pretendida conscientemente pelo ser humano (como “ser para a vida”). É a força da “ideia” hegeliana, projetada como consciência coletiva, orientada pela razão [4].
A “Utopia concreta” de Bloch elaborou a visão profética de um Estado de Direito Democrático, como direção social de um regime econômico de caráter socialista, que, se não respondeu como seriam as instituições de tal ideal de Estado, reverteu o cientificismo positivista de Engels —do “socialismo utópico ao socialismo científico”— apoiando-se numa certa reflexão de Lenin, quando este dizia: “prefiro o idealismo inteligente ao materialismo não inteligente”. O caminho proposto por Bloch é, na verdade, aquele que vai, ao contrário de Engels, do “socialismo científico” ao “socialismo utópico”.
III
Direito, Estado e Democracia, podem ser trabalhados na investigação lógico-empírica como categorias específicas, tanto da Teoria Geral do Estado como da Teoria Política. Com esta separação “pensada” pode-se colocar as instituições como “premissas” investigativas e partir, portanto, de uma “premissa maior”, que expresse que todo o sistema constitucional do Estado Democrático tem um jogo de “pesos e contrapesos”, como fator de equilíbrio do seu sistema. A partir da premissa posso verificar se os “pesos e contrapesos” estão promovendo tal “equilíbrio”. Tanto posso fazê-lo, contudo, considerando que a sua finalidade é a manutenção do sistema econômico do capital, para dar curso à acumulação privada, como posso considerar só o funcionamento coerente do sistema “em si”.
A conclusão da dedução lógico-formal, a partir das premissas, vai depender —a partir da sua escolha— de quais fatos empíricos servirão de apoio para o percurso do raciocínio. Em síntese: a partir dos fatos empíricos selecionados posso concluir, que tanto o jogo de “pesos e contrapesos” ajuda o equilíbrio funcional do sistema, como aquele jogo é fundamental —por exemplo— para a eficiência da ação colonial-imperial do Estado. Como posso, a partir do fatos empíricos escolhidos, concluir que os pesos e contrapesos dão coerência ao sistema de garantia das liberdades.
Assim, verificar o funcionamento do Parlamento, remetendo especificamente à Constituição que trata da tripartição de poderes; buscar entender o funcionamento do Estado, nos pressupostos econômico-materiais que orientam a ação estatal, em relação ao regime da propriedade, com ou sem função social; conferir a melhor forma de realizar os processos eleitorais, para facilitar o exercício das liberdades políticas e os direitos das minorias, tudo isso pode trazer grandes contribuições ao aprimoramento do sistema. Quando se analisa, porém, qual o rumo que o Direito, como direção social, imprime ao sistema, para consagrar ou suprimir privilégios de corporação ou de classe, a questão se torna mais complexa. Tal “rumo” é importante, pois as instituições técnicas e políticas do Direito, além de promoverem e garantirem, viabilizam a produção da vida social, através das quais os homens vivem a sociedade, com maior ou menor coerção, tanto das normas estatais, como da força do capital, que ensejam e limitam as liberdades, determinam e restringem as condições para a igualdade.
Na verdade, como a ordem do Estado contém uma teleologia e imprime uma orientação abstrata e genérica para os integrantes da ordem (“direção social”), de forma que eles possam mover-se no trabalho, nas relações de família, no seu engenho empreendedor, ela cria um determinado sentido, como diretriz para a movimentação dos sujeitos dentro da ordem. E isso tem a ver —como elemento teleológico predominante— com uma “direção” que dá maior suporte à liberdade, orienta para um equilíbrio entre liberdade e igualdade ou abre mais perspectivas de igualdade.
Bobbio sempre privilegiou a liberdade em detrimento da igualdade. Tratou-as, ambas —liberdade e igualdade— como categorias conexas, mas hierarquicamente desiguais. Ou, no mínimo, sem “equivalência”, já que os procedimentos do Estado de Direito, tal qual ele os compreendeu, estão direcionados socialmente para preservar a liberdade, não para promover a igualdade. No seu clássico “Nem com Marx, nem contra Marx”, ele refere, após quatro interpretações destas relações do marxismo com o Direito, a uma “quinta interpretação”, sem tirar dela todas as consequências.
Nesta “quinta interpretação”, Bobbio liga os juristas do marxismo a uma visão universal do Direito, cuja finalidade é a já referida “direção social”. Ele mesmo reconhece, porém, que esta é uma característica de todo o sistema do Direito e do seu Sistema de Justiça: “A quinta interpretação, enfim, na medida em que fala de uma ‘ciência da legitimação’, reduz as teses de Marx sobre o direito a uma ideologia do poder e, como tal, também está fora de um discurso sobre uma hipotética teoria marxiana do direito (pois) ainda é a tese do direito como instrumento de domínio de classe. Na realidade, não é verdade que a teoria soviética do direito seja apenas isso: da leitura daquilo que Cerroni escreveu sobre ela retirei a ideia de que o direito é considerado pelos juristas soviéticos um instrumento não somente de puro e simples domínio, mas de direção social, o que, sendo verdade, nada tem de especificamente marxista.” [5].
A conclusão de Bobbio, reconhecendo uma identidade entre todos os Sistemas Jurídicos como sistemas de “direção social”, portanto, estabelece também uma identidade teleológica da teoria marxista-soviética do Direito, com as teorias do jusnaturalismo. Ambos os sistemas, conforme se depreende da conclusão de Bobbio, são instrumentos de uma “direção social” (finalística) para o exercício do poder político, com normas cujos destinatários não reproduzirão exatamente o que os comandos normativos dispõem.
Esta impossibilidade de mímese, entre a ordem jurídica e a vida, é que abre um espaço considerável para a interpretação da autoridade administrativa e judiciária, até para a mudança no sentido das normas, que, se não vai ao ponto de inverter a sua finalidade, determina a aplicação desta com certa flexibilidade e imprevisão. Mas esta “direção social”, imprimida pelo Direito, é orientada em que sentido para mediar os interesses em conflito? Pode-se alegar que a ordem estatal “burguesa” orienta a sociedade no sentido da liberdade, preservando a desigualdade para os economicamente mais fortes; e a ordem estatal marxista-soviética, orienta a sociedade no sentido da igualdade, preservando a liberdade-poder da burocracia, que forma o grupo dirigente no Estado.
Bobbio, no “Futuro da Democracia”, diz que o estudo mais completo sobre o “poder invisível” (do “Governo invisível”), que é face discreta dos poderes de fato para interferir no Estado-norma —este estudo, diz Bobbio— é do americano Adam Wolfe e se reporta a ele desta forma: “é o ‘duplo estado’ (duplo no sentido de que ao lado de um estado visível existiria sempre um estado invisível), mas (…) a democracia nasceu com a perspectiva de eliminar para sempre, das sociedades humanas, o poder invisível e de dar vida a um governo cujas ações deveriam ser desenvolvidas publicamente(…)” [6]. Determinação “naturalista”, de um lado (“nasceu com”) e, de outro, otimismo com o poder das formas inevitáveis (“eliminar para sempre”), para assegurar a democracia com supremacia da liberdade.
Também aqui Bobbio não leva em consideração que as violações das “regras do jogo” não são um acidente, tanto nos regime capitalistas como nos socialistas, mas sempre uma das mais importantes “regras do jogo”. Regras reais, mais ou menos previsíveis (ou mesmo imprevisíveis), que harmonizam a liberdade e os graus de igualdade, com as instituições estatais de “direção social”. Este “Governo invisível” compõe, portanto, uma mesma totalidade, que tanto dá coerência e fluidez às relações entre a democracia e capitalismo, como harmoniza ditadura e certa igualdade no socialismo real.
O que se pode concluir por estes elementos é que nenhum sistema de Estado de Direito, por si só, é formalmente superior a outro, a não ser em momentos pontuais. A ocupação do Iraque pelos Estados Unidos e os golpes militares “comunistas”, na África, na década de 60 (promovidos pela URSS), são bons exemplo para compreender esta indiferenciação. O “estado duplo” —visível e invisível— coexiste nas democracias capitalistas e nos regimes socialistas, tanto com reflexos na vida interna de cada sistema, como nas ações perpetradas fora do seu território de jurisdição.
A transferência da violência estatal, do plano interno para o plano externo (ou do despotismo no território para o ambiente externo), é recorrente em qualquer Estado. Esta “transferência”, tanto pode ser um recurso político para manter uma hegemonia que garanta a articulação dos privilégios com a desigualdades, internamente, como pode emergir de uma necessidade geoeconômica para promover (com ações externas ao território), a indústria armamentista “dentro da lei”, como no caso do keinesianismo militar da “era Reagan”. São momentos em que o inimigo do Estado, real ou simulado —dentro ou fora das suas fronteiras— unifica o “Estado visível” com o “Estado invisível” e permite ao Estado, como totalidade orgânica, acima dos seus “associados” ou dos seus “estamentos”, criar normas ordenadas pelo seu movimento fáctico, fora das suas possibilidades legais imediatas.
Bobbio assinaria por inteiro a formulação “hegeliana de esquerda” do jovem Marx, enquanto entendimento do «dever ser» do Estado: «mais além da linguagem não técnica, não jurídica, mas pelo contrário, fortemente filosófica, o elemento que deve ressaltar-se aqui é que na concepção de Marx o Estado converte cada finalidade e interesse particular em finalidade e interesse geral, reintegrando cada particularidade na totalidade que lhe é própria enquanto Estado” [7]. Eis a mesma concepção, no plano analítico-descritivo, referida por Bobbio: «Retomando aquilo escrevi no artigo anterior, por divisão dos poderes hoje se entende um conjunto de aparatos ou instrumentos jurídicos que constituem o chamado Estado de direito. Como todos sabem, esses meios de técnica jurídica são a distinção das funções e, correspondentemente (mesmo que a correspondência não seja perfeita), a distinção dos órgãos. Esses meios fundam-se sobre algumas máximas da convivência humana (quaisquer que sejam as classes que a compõem) reduzíveis a dois grandes princípios: 1) o princípio de legalidade; 2) o princípio de imparcialidade» [8].
Por estas contradições, tanto de Norberto Bobbio como do marxismo, é que Perry Anderson lembrou: “o pensamento de Bobbio é, pois, um liberalismo aberto simultaneamente a discursos socialistas e conservadores, revolucionários e contrarrevolucionários e neste aspecto, antitético à piedade bem intencionada de seu mestre Mill” [9]. Todorov, no seu clássico “Inimigos Íntimos da Democracia”, criticou aquela contradição da “direção social” do Estado, lembrando a sua dupla possibilidade, no âmbito internacional, ora como instituição “invisível”, ora de forma visível, fora do seu território, mas extensão do seu Estado de Direito real: ““Inegavelmente, existem guerras legítimas: as de autodefesa (foi o caso da Segunda Guerra Mundial para os aliados, ou o da intervenção americana no Afeganistão, em 2001), as que impedem um genocídio ou um massacre (a intervenção vietnamita que interrompeu o genocídio cambojano em 1978-79 seria um dos raros exemplos). Em contraposição, não são legítimas as guerras que se inscrevem num projeto messiânico e cuja justificação é impor a outro país uma ordem social superior ou fazer reinarem ali os direitos humanos.” [10]
Para as concepções marxistas sobre Estado e Direito (mais propriamente “marxistas-leninistas”) depois caricaturizadas pelos juristas do stalinismo, nunca foi ilógico formular uma Teoria da Legitimidade, nem responder o que poderia, ou não, ser considerado Direito. A simplificação vem do reconhecimento da força normativa da revolução que, por si só, gera a legitimação do novo poder e das suas normas jurídicas, tanto no período revolucionário, como fora dele. Nesta hipótese a ordem jurídica —depois do período revolucionário “strictu sensu”— também está destinada a dar “direção social”, para inverter os polos de poder e dominação: o proletariado assume o Estado, pelo seu Partido, faz o Direito, que nasce legítimo, e não necessita outros protocolos para prosseguir como legítimo.
Esta simplificação esvazia o marxismo como filosofia do sujeito, porque outorga legitimidade ao sistema jurídico que sucede a revolução, simplesmente por que ele é positivo e ordenado. Mas, se a revolução vitoriosa cria a sua própria legitimidade (o que é verdadeiro), as normas que ela quer imprimir na nova ordem social, para mudar a economia e a política, não são necessariamente legítimas, só porque existe força coativa para aplicá-las. Nesta visão do neopositivismo “marxista”, elas são consideradas legítimas e válidas, porque “escritas” e garantidas pela força coercitiva do novo Estado, para serem implementadas.
O prejuízo da simplificação se expressou duplamente: de um lado, deparados com a impossibilidade de reduzir o poder coercitivo do Estado sobre a sociedade, para implantar um Sistema de Direito socialista, aguçaram-se os traços mais despóticos do Estado Moderno absolutista, originário das revoluções burguesas; de outro, deparados com a ausência do sujeito-proletário, para «guiar» os rumos do Estado, coube a condução do processo às burocracias privilegiadas do Estado-Partido, como “necessária” à sobrevivência da Revolução.
O conceito de “ditadura do proletariado” ou mesmo de “democracia popular”, que advém também desta trágica “necessidade”, foi “até o ponto de engendrar uma confusão fatal entre a ditadura, entendida como qualquer predomínio de uma parte ou classe da sociedade sobre a outra, e a ditadura, entendida como o exercício da força política eximida da sujeição a toda a lei, segundo a famosa definição de Lenin; isto é, como ordem social em um sentido muito genérico e como ordem política no sentido mais estrito” [11]. “Predomínio e exercício de força”, eximida da sujeição a toda a lei, logo, “hegemonia” (predomínio) e coerção (pura força), separadas em duas categorias que não se totalizam. É fracasso da criação de uma democracia superior, porque hegemonia sem consenso é o caminho mais curto para o regime das ditaduras.
IV
O encontro doutrinário mais significativo das concepções tradicionais do marxismo com o jusnaturalismo positivista de Bobbio, deu-se através do jurista Karl Renner. A partir da adesão de Renner aos métodos de transição dentro da ordem, a perspectiva dos teóricos marxistas foi corrigida, anulado o seu caráter originariamente “destrutivo” do “Estado Burguês”. Sustentando duas contraposições às concepções soviéticas sobre o Direito, Renner afinou-se com Bernstein: de um lado, não vê mais o Estado Constitucional Burguês como categoria jurídico-política transitória ou tendencialmente extinguível, pelo menos num horizonte previsível pela teoria; de outro, incorporou a luta de classes na democracia, transfigurada como uma luta pelo Direito e por dentro do Direito, de tal forma que o problema político da luta de classes se torna um problema jurídico dentro da ordem. Diz Renner: “por conseguinte, a luta econômica das classes adquire na sociedade civilizada a forma transfigurada de luta pelo direito; chega a ser luta jurídica. Com isso ainda mudam alguns de seus traços essenciais, pois a luta de classes tem que passar por todos os conceitos tradicionais do direito e não pode passar por eles sem expor-se a sua influência” [12]. Renner assumiu, portanto, uma nova posição sobre as relações entre Direito e Revolução, formulada na corrente do “austromarxismo”, defendendo a implementação socialista na legalidade democrático-formal do Estado de Direito. O Chile de Pinochet não deixa de ser uma crítica das armas desta concepção.
Bobbio, como todos os grandes pensadores do Direito e do Estado e todos os grandes filósofos, não produziu os seus conceitos sobre os fundamentos da Democracia e do Direito, de forma “estática”. Nesta produção há toda uma gênese (como em Marx, no “18 Brumário”), apoiada numa evolução extraordinariamente rica. Na análise, tanto como sobre o que ocorre na produção normativa do Estado que faz o Direito, como nos seus estudos das mutações dentro da ordem, Bobbio chega ao reconhecimento da possibilidade de uma origem também “contratual” das normas, no novo contexto social-democrata.
Neste período, Bobbio flexibiliza a sua visão mais fechada de uma produção normativa puramente “estatista” e passa, a partir dos anos sessenta, de uma consideração estritamente estrutural do Direito, a uma concepção que, como diz Alfonso Ruiz, “também tem em conta aspectos funcionais (…), pelas modificações introduzidas no Direito atual pelo Estado-de-Bem-Estar Social; (cujo) aporte mais significativo (…) foi a teorização das normas promocionais, normas legais, gerais e abstratas, caracterizadas pelo estabelecimento de uma sanção positiva ou premial.” E prossegue o autor: “De todas as formas, o mesmo contraste existente entre as sanções antiestatalistas e antilegalistas de Bobbio e os seus resultados mais tendencialmente estatalistas e legalistas, deve servir para evitar a conclusão, que seria precipitado, (dizer) que a sua teoria jurídica utilizou o estatalismo e o legalismo como caracteres definitórios e típicos do Direito” [13].
A evolução teórica de Bobbio, portanto, não foi reiteração argumentativa, como se desde o início tivesse “descoberto”, a partir do positivismo e das suas consequências metodológicas, o objeto a que se dedicava conhecer. Bobbio aproximou-se e afastou-se de Kelsen; foi mais, ou menos «positivista», em sentido estrito (bem «mais», certamente); aproximou-se e afastou-se das variantes históricas do Direito Natural. O permanente na sua trajetória foi a compreensão “ordenatória” da democracia, a partir do Estado de Direito, bem como a defesa da superioridade (mas não exclusividade) da origem estatal das normas, na esteira de Hans Kelsen. Sentenciou Bobbio, na sua “Teoria do Ordenamento”: “O Estado é a organização do poder coativo para a aplicação das normas; é o momento da organização da força para fazer valer as regras postas; e estas regras se qualificam como jurídicas precisamente enquanto estão garantidas por tal poder” [14].
Uma crítica ilustrada e libertária da democracia [15], porém, pode integrar sem incoerência as contribuições do jovem Marx e do Marx “reformista” (de Renner), com um Bobbio de “esquerda”. Isso é visível pelo diálogo com os dirigentes mais qualificados Partido Comunista Italiano, admitindo a opção por uma democracia “novo tipo”, na qual formas participativas viabilizassem mais equilíbrio entre liberdade e igualdade. Para isso, seria preciso “concretizar o concreto”, ou seja, formular para uma “utopia realista” as instituições concretas: construir ordenamentos públicos, para que as “ondas de Participação cidadã” tivessem seus interesses sustentados no Estado, fundindo a representação política estável com a democracia direta de participação voluntária. Para este objetivo o Estado deveria ser aparelhado com instituições de Direito Público, que garantissem à participação dos cidadãos, para construir programas com escuta social permanente; apreciar investimentos privados de interesse público; hierarquizar os gastos do orçamento público; revogar decisões que aumentassem ou consolidassem privilégios.
Estes são alguns dos “interesses sustentados” que poderiam abrir aos cidadãos o controle do Estado, para “controlar os controladores”, como dizia frequentemente Bobbio. A questão que fica pendente é se estas novas formas de participação democrática, que hoje que podem ser apoiadas por formidáveis recursos tecnológicos seriam assimiladas pelo “Estado invisível”, a parte mais forte dos poderes conservadores de classe, na sociedade democrática.
V
A expansão dos dois atributos chaves do Direito e do Estado Moderno (a liberdade e a igualdade) depende da força com que a esfera da política, através do “povo concreto”, pode se fazer presente na vida pública do Estado. Como reconhece F. Müller e autores, como Boaventura Santos, A. Baylos e F. Comparatto, a partir da sua “força normativa” de fato, o povo pode imprimir “direção social” à ordem, inclusive operando interpretações de sentido e das funções das instituições, como ocorre em ambientes políticos favoráveis.
As demandas de liberdade e igualdade expressam-se, com maior ou menor força nos movimentos da sociedade civil, nas decisões dos Tribunais, na interpretação de determinados precedentes administrativos, para daí interferirem na composição da «superestrutura» e voltarem à sociedade como “direção social”. Estes movimentos da política, dentro e fora do Estado, também promovem constrangimentos sobre a base ”material-econômica” (como quer o marxismo tradicional); sobre a vida associada dos indivíduos na sociedade (como queria Hobbes), sobre as relações internas nos «estamentos» (como apontava Hegel). A expansão, portanto, da liberdade e da igualdade, não são determinadas só pelo direito-norma, como máquina político-administrativa, mesmo que o Estado force a “subsunção” da sociedade na sua estrutura ideal.
B. Santos, conclui com clareza solar: “a justiça constitucional pode chegar a ser importante para o progresso democrático, sempre e quando for entendida como um componente de lutas sociais mais amplas. A realização das promessas emancipatórias de muitas constituições é um assunto demasiado sério para deixá-lo unicamente nas mãos dos juízes constitucionais” [16].
Bobbio, mesmo negando a igualdade como “valor” equivalente à liberdade —pois isso geraria um tormento indecifrável pelo seu método positivo— prefere o par liberdade e justiça, não liberdade e igualdade. Mesmo assim Bobbio é obrigado a outorgar um certo valor à igualdade, na medida que ela seja condição para o “justo” : “Se se quer conjugar os dois valores supremos da vida civil, a expressão mais correta é liberdade e justiça e não liberdade e igualdade, já que a igualdade não é, por si mesma, um valor, mas o é somente na medida em que seja uma condição necessária, ainda que não suficiente, daquela harmonia do todo, daquele ordenamento das partes, daquele equilíbrio interno de um sistema que mereça o nome de justo” [17]. Hegel —em sentido adverso— sustentava que a harmonia seria possível se feito um “depósito” fiduciário da “liberdade” dos indivíduos (localizados no «estamentos»), na potestade do Estado, porque o Estado seria a “realidade da liberdade concreta.» Hobbes, inspirador maior de Bobbio, via o Estado harmonizado pela livre associação em torno do Soberano, comprometido com determinados fins, porque o Estado sem esta vontade de associação não poderia bloquear a guerra “natural” entre os homens.
As tensas relações de Hegel com o jusnaturalismo são reproduzidas —como aproximação e repulsa— nas relações de Bobbio com o legado de Hegel. Explico: Hegel dissolve o cidadão na totalidade do Estado, que incide sobre ele como limitador de opções, para ungi-lo, em resposta a esta “confiança”, à condição de integrante de um «povo». Para Hegel é o Estado que “funda” o povo [18]: integrante de um estamento (comunidades orgânicas que são sintetizadas no Estado), o indivíduo torna-se depositante da sua liberdade no Estado e o Estado se torna, por este processo, depositário e ordenador dos estamentos, para fundar a “verdadeira” liberdade, que ocorre na vida estatal.
Bobbio, embora divirja sobre a visão totalizante de Hegel, ao reconhecer a supremacia da estatalização do Direito, ou seja a supremacia das suas estruturas normativas sobre tudo que é criado pelas partes, cancela a visão hegeliana. E o faz através da importância que outorga ao regramento coercitivo, para garantir propriedade e liberdade, através das regras do jogo. Diz Bobbio: “Mas todas estas ambiguidades revelam uma mais profunda: a atitude de atração-repulsa (de Hegel) diante do jusnaturalismo. Repulsa pelo instrumento empregado, atração (irresistível) pela meta proposta. Depois de ter recusado o jusnaturalismo em suas categorias fundamentais —do estado de natureza ao contrato social—, Hegel realiza muito mais integralmente sua tarefa histórica, que é aquela de dar uma justificação racional do Estado através do Direito. Em relação ao jusnaturalismo, Hegel é, ao mesmo tempo, um crítico desapiedado e um fiel executor” [19].
A correspondência de Norberto Bobbio com Perry Anderson, trocada entre novembro de 1988 e maio de 1989, aponta as variações de Bobbio sobre determinados temas, bem como as mudanças no pensamento marxista de Anderson (já não soviético), em relação à concepção que se convencionou chamar de marxista-leninista. Pode ser apontada, ali, uma proximidade entre os fundamentos normativos, exigidos pelo positivismo lógico para o Estado de Direito, e a apreensão dogmática que o marxismo desenvolveu, para o seu Estado e o seu Direito, já buscando conciliar democracia e socialismo. Ali emergem sinais, portanto, de uma cooperação pelo menos doutrinária, que integre estas duas grandes vertentes do pensamento iluminista, para reconciliá-las na questão democrática.
Escreve Norberto Bobbio para Perry Anderson: “Desde o ponto de vista ideológico creio que a principal razão da nossa discrepância é o meu inicial e nunca abandonado liberalismo, entendido, como eu o entendo, digo de uma vez por todas, como a teoria que sustenta que os direitos de liberdade são a condição necessária —ainda que não suficiente— de toda democracia possível, inclusive a socialista (em caso de que seja possível)” [20]. Perry Anderson, na troca de correspondências, ao comentar a previsão de Bobbio sobre a “vitória” do Estado de Direito Democrático na URSS apontou: “Aquele dia finalmente chegou. Você é demais modesto para citar-se, mas tem todo o direito de sentir-se profundamente satisfeito por esta grande mudança. Naturalmente qualquer juízo sobre o processo que se está levando a cabo não pode ser senão prudente e provisório. Com efeito, seu resultado não poderia ser mais incerto. A perestroika poderia carecer do objetivo de um liberal-socialismo (…) e recair em algo similar à ditadura burocrática anterior, ou fugir mais adiante até uma recomposição de fato do capitalismo, ou talvez combinar ambos os males. Mas entre estes dois perigos (…) se soma também a possibilidade de que se realize a longo prazo o que poderíamos legitimamente definir como um socialismo liberal. E não vejo de que maneira qualquer marxista contemporâneo poderia deixar de saudá-la com fervor, na medida em que reconheça o inadequado da herança do próprio marxismo” [21].
Na mesma manifestação, Bobbio dizia ser possível que «esta ideia fixa» (privilégio da liberdade em relação à igualdade preservada pelo ordenamento), fosse originária do fato dele ter pertencido a uma geração que, vivendo sob uma ditadura (o fascismo), concebeu a importância das liberdades —a liberdade de querer fazer o Direito (não a possibilidade real de fazê-lo)—, como valor orientador das concepções que inscreveu na Teoria do Ordenamento. O reconhecimento das opções metodológicas de Bobbio, como condicionadas historicamente (fora de qualquer inspiração metafísica), abriu uma nova fronteira no diálogo jusfilosófico.
O reconhecimento, fundado na história pessoal de Bobbio, traduziu —na verdade— motivos nada filosóficos para o seu afastamento, tanto em relação à «ideia» hegeliana como fonte ordenadora do Estado (que «funda» o povo), como apresenta motivos contingentes, também nada filosóficos, para a defesa radical dos princípios do normativismo (que funda o Estado), acolhidos então por influência de uma situação histórica enfrentada duramente: o fascismo. A “ideia” hegeliana é, então, subordinada a uma experiência pessoal, e o normativismo radical (apoiado na “associação entre “iguais”), que funda o Estado, torna-se justificado como garantia política formal contra a ditadura.
O que se coloca hoje como problemático é que a ideia expressa nas normas que vem do Estado, ou a norma que institui o Estado (respectivamente em Hegel e Bobbio), não conseguem mais bloquear uma força normativa —extra-jurídica e supra-estatal— que tanto enfrenta o poder constituinte legítimo da associação de Bobbio, como a ideia abstrata, fundadora do Estado, de Hegel.
Este poder normativo, pelo peso histórico da sua facticidade, é a força concreta não associada, do poder normativo do capital financeiro: é o auto-regramento da sua mobilidade (predicado que é o próprio sujeito), que passou a submeter as «regras do jogo», tanto do “Governo visível”, como do “Governo invisível”. Ele já é a ideia organizadora da ordem, enquadrando o Direito e superpondo a sua força à vontade normativa do Estado.
Assim, limitando a soberania popular ao não essencial, este “enquadramento” se torna lei e/ou «flexibiliza» a constituição, forjando normas fora do direito positivo, mas que se tornam legítimas dentro do ordenamento. Pode ser sustentado, através de uma compreensão desta força em força da naturalidade (um “jusnaturalismo” do capital financeiro), que tal processo é “civilizador” e universalizaria uma etapa da modernidade, que, no futuro, será recomposta por padrões neoiluministas. Não se pode sustentar, porém, que esta nova força de conformação do Direito e do Estado (mínimo), não abale as certezas do idealismo subjetivo de Hegel e do jusnaturalismo positivista de Bobbio.
A crítica marxista do Direito e do Estado, ajudou a desnudar os mecanismos de dominação do Estado Democrático de Direito, formatados a partir das doutrinas iluministas da liberdade, cujo elemento revolucionário está contido no princípio da igualdade formal, que é o mais efetivo na vida real. Por este princípio todos os cidadãos —formalmente— podem querer ser iguais, o que significa trazer para a ordem jurídica, como valor socialmente agregador, as liberdades políticas e civis, que ficam garantidas no princípio da inviolabilidade dos direitos, mas que também garante a supremacia do direito de propriedade.
É importante salientar que a possibilidade de ser proprietário foi elemento decisivo para legitimar as liberdades civis e políticas. O direito de qualquer do povo ser “proprietário”, consagrado nas revoluções burguesas contra os privilégios de casta e ordem, foi um elemento tão vital nas revoluções como a promessa das liberdades políticas. Também, por isso, o sistema jurídico do Estado Democrático de Direito atingiu um grau de perfeição estética —baseado na liberdade, na igualdade e na propriedade— cujas promessas geraram consensos mais estáveis do que os promovidos pelas revoluções socialistas. As liberdades ficaram submetidas, todavia, ao mesmo grau de proteção do direito à propriedade, o que impõe limites para que as pessoas, mesmo vivendo em liberdade e abrigadas no princípio da inviolabilidade dos direitos, tenham a mesma possibilidade de acesso aos direitos fundamentais.
Ao formar instituições de Direito Civil abrangentes e constitucionalizar direitos fundamentais, os ordenamentos das revoluções dos séculos XIX e XX, distribuíram as possibilidades de acesso ao poder político na democracia, já com as limitações da nova hierarquia social das relações entre proprietários e não proprietários, entre o trabalho e o capital no capitalismo triunfante. Os direitos do mundo do trabalho foram adquiridos por saltos reformistas, mas os direitos do proprietário burguês foram consolidados por séculos de evolução social e econômica, o que permite que estes sejam mais efetivos que os primeiros e que o direito público e direito privado, desta ordem jurídica nova, harmonizem os conflitos mais fortemente ancorados nos princípios do direito privado, do que no direito público, para não alterar a hierarquia social contida no sistema do capital.
Quando da emergência das revoluções socialistas, que aliás ocorreram nos países do capitalismo mais atrasado, o Direito socialista reforçou os poderes do Estado, “estatizou” a sociedade civil, promoveu a dominação mais pela força do que pela capacidade de reorganizar o consenso e serviu-se dos traços mais despóticos do Estado Moderno. Em consequência, somou o pior do positivismo com o jacobinismo da legalidade socialista-soviética, naturalizando o “Estado invisível” da burocracia, que não resistiu ao seu próprio sucesso. À medida que foi revolucionando o consumo popular básico, a educação e a saúde pública, foram criados cidadãos, ora mais exigentes, ora mais inertes, que passaram da passividade à ação, testando a capacidade coercitiva do Estado socialista autoritário, pressionando-o até vencê-lo.
A crítica de Friedrich Müller serve para os dois sistemas: “Conforme ensina a experiência, as distorções no campo do Estado de Direito assumem aqui proporções estarrecedoras: por um lado se recorre à maior parte da população, por outro lado não se investe essa parte da população de direitos; por um lado, a maior parte da população é ‘integrada’ na condição de obrigada, acusada, demandada; por outro lado, ela não é integrada na condição de demandante, de titular de direitos. Os direitos fundamentais não estão positivamente à disposição dos indivíduos e dos grupos excluídos, mas os direitos fundamentais e humanos destes são violados (de forma repressiva e de outras formas). Normas constitucionais manifestam-se, para eles, ‘quase só nos seus efeitos limitadores da liberdade’, seus direitos de participação política aparecem —diante do pano de fundo da sua depravação integral— preponderantemente só no papel, assim como também o acesso aos tribunais e à proteção jurídica” [22].
Ao estatizar a economia de forma radical e acabar de forma abrupta com o mercado (inclusive face às pressões da guerra civil e ao cerco militar do ocidente), a experiência jurídica do Estado Soviético pretendia iniciar a transição para a sociedade sem classes, sem imaginar instituições de um Direito Público mais democráticas, em relação à ordem jurídico-estatal derrubada. Quando pôde não as fundou com estruturas e formas mais democráticas do que as do Estado de Direito das revoluções do Século XIX, baseadas numa dialética de ruptura e continuidade das experiências do «common law» e da «rule of Law”, experimentadas a partir de uma sequência de lutas políticas e sociais de grande envergadura histórica.
Ao preferir a construção metafísica do «homem novo», que já se mostraria na construção socialista, estas ordens jurídicas se tornaram cada vez mais irreais e até mesmo irônicas em relação à vida real do povo concreto. Ao supor uma compulsão revolucionária permanente, que não respondia às necessidades cotidianas do povo, não perceberam que aquela subjetividade pública heroica, imediata à revolução, seria logo amortecida. Nestas condições, a teoria marxista abdicou de construir, para a transição, um novo Direito para um novo Estado e os juristas que tentaram responder a este desafio, como Pashukanis e Bloch, ou foram fuzilados ou partiram para o exílio.
As transformações socialistas só teriam permanência com instituições jurídicas estáveis se, ancoradas na história precedente, abrissem uma nova tradição, com uma vida cotidiana mais rica e menos alienada, abrigada nos valores tanto da liberdade como da igualdade, sem hierarquia entre elas. As instituições universais de controle público do Estado —sobre a burocracia, sobre a planificação da economia, sobre a regulação do mercado, sobre a polícia e o poder da polícia— configuradas por organismos ágeis e previsíveis, poderiam impedir que a burocracia do Partido e do Estado montassem os seus “governos invisíveis”, com a força do privilégio e da corrupção.
No plano da produção, ao invés de estatizar completamente a economia, a doutrina “soviética” poderia ter forjado uma nova Teoria da Empresa que, ao mesmo tempo, que estimulasse a capacidade empreendedora das pessoas —o que não é atributo específico do capitalismo— organizasse o mercado a partir de demandas reais de bem-estar, para a maioria, não a partir de planos ultracentralizados.
Nenhuma reforma ou revolução socialista constituiu estatutos específicos de Direito Público superiores aos precedentes, de Direito Civil e Comercial, que ensejassem a ruptura com o sócio-metabolismo do capital, que continuou funcionando com os padrões de capitalismo de estado (Mèzáros), bloqueando a eficiência tecnocrática, baixando a produtividade, incapacitando para a inovação e para a criação de novas tecnologias, bem como gerando cidadãos amedrontados, alheios à cena política, que só era produzida nas malhas da burocracia.
As crises das democracias no Ocidente, por seu turno (ao norte e ao sul), estão próximas ao seu impasse mais radical. Trata-se de verificar até que ponto pode chegar o sequestro do Soberano pelas forças do “Governo invisível”, nas trevas do “Estado invisível” do capital financeiro. De verificar, ainda, se haverá energia disponível na sociedade para o povo recuperar o seu poder constituinte, dando um novo sentido à previsibilidade democrática, ou pelo menos para uma imprevisibilidade acordada, como queria Rawls, no seu “Teoria da Justiça” [23], para tornar possíveis instituições formais novas, capazes de promover a equivalência entre os direitos provindos da liberdade e os deveres constitucionais de promoção dos direitos fundamentais.
Estes são os desafios da “crise do Direito democrático”, cuja abordagem crítica se dá a partir da identidade dos valores da igualdade e da liberdade, que, se não estão devidamente considerados pelo normativismo de Bobbio, também não foram rejeitados por ele. Valores que também não foram integrados na teoria marxista tradicional do Direito, mas que não são bloqueados por ela. A crítica que Umberto Cerroni faz de Kelsen, a respeito do mistério da sua norma fundamental e do surgimento dos novos ordenamentos é válida, tanto para superar as limitações de Bobbio, na sua concepção estatalista de ordenamento, como também o é para abrir a concepção marxista para um novo rumo, fundado numa legalidade socialista que concilie democracia e socialismo.
Sobre o tema essencial, da instauração de um novo ordenamento, Cerroni faz crítica que pode ser endereçada tanto a Bobbio como à doutrina soviética do direito: “Kelsen tem que abandonar o princípio legalista da validade e substituí-lo pelo do fato consumado, fazendo da sua teoria um registrador apologético do fato” [24], isto é, da força. Sair desta armadilha é abrir um caminho para sair da crise do direito democrático.
No pequeno volume publicado no Brasil, «Igualdade e Liberdade», no qual Bobbio estuda alguns dos temas contidos no seu “O Futuro da Democracia”, ele explicita que a «igualdade entendida como equalização dos diferentes é um ideal permanente e perene dos homens vivendo em sociedade» e que jamais as fontes da desigualdade foram tão debatidas como hoje: «a raça (ou, de modo mais geral, a participação num grupo étnico ou nacional), o sexo e a classe social» [25]. Após, ele se questiona e aduz: «qualquer pessoa sensata deve não só duvidar seriamente de que ela (a desigualdade) possa um dia ser inteiramente superada, mas também indagar se é razoável propor esta superação» [26].
Se considerarmos as demandas da igualdade social como idênticas, ou apenas uma mudança de termos, em relação ao igualitarismo dos movimentos da Idade Média que atravessaram a modernidade, efetivamente estas demandas não têm chance histórica de serem realizadas. A revolução capitalista que implodiu as sociedades de ordem, de casta e de privilégios feudais, ao mesmo tempo que estruturou enormes grupos coletivos com identidade comum pelo trabalho e pela propriedade, valorizou e configurou, socialmente —na produção, no consumo, nos direitos— indivíduos capazes de vontades próprias, articuladas socialmente e juridicamente assistidas, necessárias à reprodução sócio-econômica, tanto das coletividades às quais se vinculam, como nas suas relações de família, afetivas ou homoafetivas.
Para Bobbio, o que hierarquiza a liberdade como ideal que precede a igualdade é que a liberdade “na tradução liberal é individualista”, enseja “a redução a termos mínimos do poder coletivo, personificado historicamente pelo Estado”. E a liberdade de “tradição libertária é comunitária e se realiza plenamente apenas na máxima distribuição do poder social” [27]. Assim, liberdade e associação, constituiriam uma contradição, ao mesmo tempo estimuladora da liberdade e obstáculo para promover a igualdade, que Bobbio espontaneamente identifica com o “igualitarismo”. A liberdade —porém— como valor superior, vinculado ao indivíduo livre, que quer poder ser igual, outorga a este, tanto o direito de querer ser superior, como o direito de conformar-se em não ser socialmente superior e também pretender ser, por exemplo, culturalmente superior, ou mesmo superior “a seu modo”: aceitar ser feliz como desigual, com aquilo que satisfaz a sua individualidade em liberdade.
Aqui é preciso distinguir igualdade e igualitarismo. Se entendermos a igualdade socialista como uma prescrição obrigatória de níveis máximos de diferenças de renda e de direitos inalienáveis, para todos, que o Estado pode garantir pela coerção, ela não se torna impossível nem suprime a liberdade do outro de ser desigual.
O igualitarismo é, na verdade, inalcançável, independentemente do regime social e de propriedade, porque vai confrontar sempre com o desejo dos indivíduos que aceitam ou querem ser minimamente desiguais, porque prezam a diferença; mas o segundo —igualdade social máxima em liberdade— é alcançável, dependendo de como a organização estatal e social a promova, alternando consensos e coerções legítimas, através de métodos democráticos previsíveis.
O igualitarismo exige uma adesão extremada da subjetividade individual na formação da comunidade igualitária, através de uma sectarização conformista, que é compatível com uma sociedade totalitária, não com a democracia socialista. Este igualitarismo, que parte de uma uniformidade mental arbitrária é, aliás, o cerne ideal do fascismo societal (Boaventura), que está abrigado no neoliberalismo e que transforma os cidadãos em servos do consumismo. Sua utopia de direita é a uniformização das massas pelo consumo predatório, baseado numa relação descontrolada com a naturalidade, pela sublimação histérica do presente, pela manipulação da biogênese na reprodução humana, promovendo, assim, uma pseudo-igualdade, social e cultural, através de processos de dominação que já estão presentes na cultura popular de massas.
Diz Bobbio, baseado nas lições de Adorno: “Diante do produto da indústria cultural, o indivíduo não deve trabalhar com a própria cabeça: o produto é vendido já inteiramente acabado e pronto para o uso. Não deve pensar e sim se divertir; não deve ser perturbado, abalado, atormentado, mas sim distraído, amansado, pacificado consigo mesmo e com a sociedade. O efeito é um entorpecimento geral, um nivelamento dos gostos e das aspirações, uma completa e incruenta despersonalização, a eliminação da privacidade silenciosa em troca de uma publicação despudorada e ruidosa: a indústria cultural realizou perfidamente o homem como ser genérico. Cada um se torna aquilo que lhe permite substituir qualquer outro: fungível, um exemplar (M. Horkheimer e Th. Adorno, Dialettica dell’illuminismo, Turim, 1966, p. 157). Nessa situação, falar ainda de liberdade pode aparecer como uma blasfêmia, um modo de invocar o nome de Deus em vão; uma palavra demasiadamente solene para um mundo tão esvaziado e conformista, um mundo no qual, no lugar da inteligência pessoal, tem-se a repetição, a imitação, a adaptação, a aceitação incondicionada da lógica do domínio. O protagonista (se ainda se pode empregar uma palavra de outrora) da sociedade dominada pela indústria cultural é o servo sublimado e satisfeito, precisamente o contrário do cidadão de Rousseau, que era obrigado a ser livre” [28].
A citação de Bobbio mostra que sua inteligência luminosa e o seu humanismo militante chegaram a um impasse dramático, no qual as relações hierárquicas entre liberdade e igualdade deveriam ser revistas, para ambas persistirem como bússolas da democracia revisitada.
* Os primeiros parágrafos do presente texto foram feitos em colaboração com Ricardo Zamora, destinados a um outro artigo, que está em preparo, comemorativo aos trinta anos do livro de Bobbio, “O Futuro da Democracia”.
[1] BOBBIO, Norberto. “Os intelectuais e o Poder – dúvidas e opções dos homens de cultura na sociedade contemporânea”. São Paulo: Editora Unesp, 1997, p. 67.
[2] ROUANET, Sergio Paulo. “Por um saber sem fronteiras”. In: “Mutações – ensaios sobre as novas configurações do mundo”. São Paulo, Ed. SESCSP / Agir, 2008, p. 359: “A Escola de Frankfurt rejeita essa formulação, ao comparar a teoria tradicional com a teoria crítica. Para Horkheimer, a teoria social crítica não somente não perde sua cientificidade quando toma partido pela transformação de uma realidade desumana, como só nesse momento se torna verdadeiramente científica. Mas isso pressupõe justamente a operação mais abominada pelos positivistas, a introdução explícita dos julgamentos de valor. Essa introdução só poderia justificar-se com a extinção do grande abismo entre fatos e normas, entre o Sein e o Sollen, o que significaria o fim do grande interdito positivista que condena as proposições normativas e axiológicas à esfera do incognoscível e do não-científico”.
[3] GENRO, Tarso. “Utopia Possível”. Porto Alegre: Artes & Ofícios Ed., 2004, p. 124.
[4] BODEI, Remo. “Introduzione all’edizione italiana” do livro de Ernst Bloch, “Karl Marx”. Bologna: Il Mulino, 1972, p. 19: “O ‘princípio esperança’ não deve ser interpretado somente como entidade psicológica, mas sobretudo como manifestação ontológica(…).
[5] BOBBIO, Norberto. “Nem com Marx, nem contra Marx”. São Paulo: Editora Unesp, 2006, p. 216.
[6] BOBBIO, Norberto. “O Futuro da Democracia – uma defesa das regras do jogo”. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 4ª edição, 1989, p. 29.
[7] GUASTINI, Ricardo. “El léxico jurídico del Marx Liberal”. México: Universidad Autónoma de Puebla, 1984, p. 102.
[8] BOBBIO, Norberto. “Teoria Geral da Política: a filosofia política e as lições dos clássicos”. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000, 20ª reimpressão, p. 288.
[9] ANDERSON, Perry. “Democracia y Socialismo – La lucha democrática desde una perspectiva socialista”. Buenos Aires: Editorial Tierra Del Fuego, 1988, p. 26/27.
[10] TODOROV, Tzvetan. “Os inimigos íntimos da democracia”. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 86.
[11] ANDERSON, Perry. “Democracia y Socialismo – la lucha democrática desde uma perspectiva socialista”. Buenos Aires: Editorial Tierra Del Fuego, 1988, PP. 27/28
[12] SINOPTICUS, Staat und Nation, Viena, 1899, p. 25. In: LESER, Norbert. “Hans Kelsen y Karl Renner”. “Teoría Pura del Derecho y Teoría Marxista del Derecho”. Bogotá (Colombia): Editorail Temis Librería, 1984, p.57.
[13] MIGUEL, Alfonso Ruiz. “Filosofia y Derecho em Norberto Bobbio”. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1983, pp. 271/272. “O Estado é hoje, mais que a realidade de uma vontade substancial, o mediador e a garantia dos acordos entre as grandes organizações, partidos, sindicatos, empresas, que atuam como potências semi-independentes (…), cujos conflitos se resolvem depois de largas e laboriosas negociações com acordos que, como todos os acordos bilaterais, se baseiam em concessões recíprocas e duram o que dura o interesse dos contratantes em observá-los. Para a vida e a sobrevivência de um Estado atravessado por conflitos entre grupos de interesses contrapostos é mais importante um convênio coletivo entre sindicatos e empresas que uma lei do parlamento, um acordo entre partidos, mais do que a vontade do abstrato titular da soberania, o povo, esse contínuo intercâmbio entre proteção por parte do governante e consenso por parte do governado, que está na base da legitimação de um Estado democrático, de um Estado, precisamente, baseado no consenso.” (p. 273).
[15] PASQUINO, Gianfranco. “La Democracia Exigente”. Madrid: Alianza Editorial, 2000, p. 78: “(…) afirma a imprescindível necessidade de que a democracia não se detenha nas técnicas para eleger governantes e para elaborar as decisões (…). A democracia permanece, pois, por debaixo das suas promessas e de suas expectativas porque renuncia deliberadamente a perseguir este objetivo ou porque não se dota de instrumentos para consegui-lo”.
[16] SANTOS, Boaventura de Sousa. “Democratizar a democracia – os caminhos da democracia participativa”. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2002, p. 335.
[17] BOBBIO, Norberto. “Igualdade e Liberdade”. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996, p. 16.
[18] BOBBIO, Norberto. Estudos sobre Hegel – Direito, Sociedade Civil, Estado”. São Paulo: Editora Brasiliense S.A., 1991, p. 99: “”Contrariamente à teoria política predominante dos jusnaturalistas, o Estao de Hegel não é um Estado de indivíduos, mas um Estado estamental. Quem considerar um conjunto de indivíduos singulares não ordenados em estamentos jamais chegará, segundo Hegel, ao conceito de Estado. Basta recordar uma passagem famosa da Encyklopädie: ‘O agregado de indivíduos privados costuma muitas vezes ser chamado de povo, mas, considerado tal agregado como tal, tem-se vulgus, não populus; sob este aspecto, o único escopo do Estado é que um povo não venha à existência, ao poder e à ação, enquanto for agregado, mas precisamente, quando estiver articulado em estamentos, que são os ‘momentos orgânicos’ da sociedade civil.”
[19] Idem. P. 93
[20] ANDERSON, Perry; BOBBIO, Norberto. In: “Socialismo / Liberalismo / Socialismo Liberal”. Caracas (Venezuela), 1993, Pp.85/86
[21] ANDERSON, Perry; BOBBIO, Norberto. In: “Socialismo / Liberalismo / Socialismo Liberal”. Caracas (Venezuela), 1993, PP.92/93
[22] MÜLLER, Friedrich. “Quem é o povo? A questão fundamental da democracia”. São Paulo: Editora Max Limonad, 1998, p. 95.
[23] RAWLS, John. “Uma Teoria da Justiça”. São Paulo: Martins Editora, 3ª edição, 2008.
[24] CERRONI, Umberto. “Marx y El derecho moderno”. Buenos Aires: Jorge Álvarez Editor, 1965, p. 145: “Sobre o tema essencial da instauração de um novo ordenamento, Kelsen tem que abandonar o princípio legalista da validez e substituí-lo com o de fato consumado fazendo da sua teoria pura um registrador apologético do fato.” (…) “passando por alto a conexão histórica que o subentende (o novo ordenamento) o quanto foi depreciado como mera natureza (…) grosseira naturalidade da força”. CONFERIR
[25] BOBBIO, Norberto. “Igualdade e Liberdade”. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996, p. 42.
[26] Idem, p. 46.
[27] Idem, p. 72.
[28] BOBBIO, Norberto. “Igualdade e Liberdade”. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996, pp. 91/92.
[Fuente: Leitura Global]
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